sábado, 20 de fevereiro de 2010

Construindo pontes!

Paula Bernasconi

Existem algumas palavrinhas que juntas tem um grande potencial de produzir resultados incríveis mas não são nada simples de conseguirmos aproximá-las. Conservação e Desenvolvimento, Ciência e Prática, Educação e Conhecimento tradicional são algumas delas e as estratégias para construirmos essas “pontes” foi exatamente o tema de uma conferência realizada na Universidade da Flórida, entre 28 e 30 de Janeiro, organizada pelo Tropical Conservation and Development Program (http://conference.ifas.ufl.edu/tcd/).


Alguns podem achar que é um tema batido, afinal é óbvio hoje em dia que essas pontes são necessárias mas será que estamos mesmo promovendo elas na prática? Dos milhares de municípios brasileiros quantos são os que apresentam um aumento da qualidade de vida da população (desenvolvimento) e ao mesmo tempo uma melhoria da conservação do ambiente? Estamos conseguindo permitir a crianças e jovens de comunidades ribeirinhas, tradicionais, indígenas e rurais o acesso a uma educação que os inclua e ao mesmo tempo aborde e valorize o conhecimento tradicional de suas comunidades? Os nossos jovens mestres e doutores em seus estudos de caso estão produzindo conhecimento que reflitam melhoria para seus "estudados" na prática?

Também temos que reconhecer que existem avanços. Na conferência foram discutidas estratégias de aproximar Conservação e Desenvolvimento em três categorias: Abordagens baseadas em garantia de direitos, Abordagens baseadas em mercado, e Gestão de paisagem em multi-escalas.

Dentre as abordagens baseadas em garantia de direitos, destaco o relato apaixonado e apaixonante de Mary Allegretti (antropóloga brasileira) sobre a trajetória da luta de seringueiros pelos direitos de posse e exploração da floresta através da história da RESEX Chico Mendes. Ainda há muito a ser conquistado e aprimorado mas em pouco tempo muitos povos da floresta, quilombolas e indígenas conquistaram do governo brasileiro seus direitos no reconhecimento de seus territórios na Amazônia.

Sobre as abordagens baseadas em mercado, outro exemplo vindo do Brasil gerou muito debate: as mesas redondas que visam criar certificações para commodities, por exemplo a Mesa Redonda da Soja Responsável, e a da Pecuária. A iniciativa de setores produtivos sentarem na mesa com ONGs, compradores e sociedade e discutir critérios e parâmetros de produção responsável e sustentável foi considerada louvável, mas questionamentos surgiram sobre a dificuldade de monitoramento / verificação de cumprimento dos critérios, assim como em qualquer certificação. Outra questão é: será que o fato dessas mesas redondas serem setoriais não acaba camuflando responsabilidades e criando vilões? Por exemplo no desmatamento da Amazônia, a moratória da soja é considerada um sucesso pois não houve praticamente nenhum plantio de soja em área desmatada, mas com certeza o avanço da soja em área de pasto promoveu o avanço do pasto sobre a floresta na fronteira, então indiretamente causou desmatamento. E aí, a culpa é só da pecuária?

Na seção de gestão da paisagem em multi-escalas Daniel Nepstad, IPAM, apresentou as estratégias do governo de Mato Grosso na gestão de seu território através do licenciamento de propriedades e do controle do desmatamento. Em pouco tempo o Estado apresentou uma grande redução de desmatamento e hoje está com Zoneamento Sócio Econômico Ecológico em fase de aprovação, aprovou seu Plano Estadual de Controle do Desmatamento e Queimadas e instituiu um Fórum de Mudanças Climáticas. Agora o governo estadual demanda do governo federal sua parcela de recursos advindos do REDD. Ao mesmo tempo quer continuar campeão em produção de soja, algodão, milho e carne apostando no aumento da produtividade e intensificação da produção para saciar a fome do mundo... Ainda existe uma luz amarela acesa, vale o alerta feito por Nepstad no início de sua palestra: que tal pensarmos em reduzir nosso consumo de carne se queremos reduzir o desmatamento da Amazônia?

Enfim, o resultado é que ainda não temos respostas prontas nem modelos que balanceiem perfeitamente conservação e desenvolvimento. Um ou outro sempre acaba prevalecendo e isso significa que temos muito trabalho pela frente. Ainda mais se pensarmos nas mega diversidades de comunidades, culturas, ambientes e ecossistemas que geram demandas de conservações e desenvolvimentos diferentes. Nunca vai existir um só modelo.

Mas de qualquer forma, é só através da construção de parcerias, trocas de experiências e de inspirações, realização de debates, é que conseguiremos avançar nesse desafio de aliar Conservação e Desenvolvimento, seja onde for. E isso com certeza foi um grande resultado dessa conferência.

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